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Beleza, prólogo

 

1 abr 2020

Milena Félix

“Você tem que usar roupas mais bonitas pra ver seu namorado”. Essa era a frase que me vinha à cabeça quando eu tentava argumentar, em uma discussão imaginária, porque a tentativa de ficar bonita era uma forma de violência. 

Tudo o que eu sabia era que a Beyoncé tinha uma música dizendo isso, e que eu sentia exatamente que não devia tentar me enquadrar em coisas que eu nunca ia conseguir alcançar. Estava cansada de odiar o meu corpo. Foi uma longa jornada desde os 11 anos. Eu havia decidido não me importar mais e não me machucar mais para tentar me encaixar. Mas as pessoas não gostavam disso.

Eu dizia para o meu interlocutor também imaginário que as mulheres não devem perseguir a beleza. Porque a beleza não tem fim nela mesma, e o que se quer, na verdade é algo além do simples estar bonito. Conquistar um par romântico? Colocar uma foto mais atraente no currículo? Ser incluído em um grupo? Parar de se sentir humilhado? Ser livre para ser feliz? Talvez um pouco de tudo. A questão é que ninguém nunca alcança esse fim pelo caminho da beleza.

Para mim, sempre quis a felicidade. E eu explicava, devaneando no meu tempo livre durante a viagem de carro, que eu - e todas as outras pessoas que queriam adaptar sua aparência - estava enganada. A felicidade não viria por meio da beleza, porque a beleza é um caminho que não leva a fim nenhum. Eu não seria bela um dia, sempre quereria ser bela, a cada dia uma nova coisa para querer, um objetivo que atraía outro após outro. Se a beleza nunca ia chegar, a felicidade também não. Assim como um amor, o currículo e o grupo de amigas. E então o que eu podia fazer? Continuar na espiral viciosa da busca pela busca?

Eu ainda me lembrava do que a busca tinha me custado. Essa é uma condição que a gente costuma esquecer, mas eu me lembrava. A busca não é democrática nem livre, mas custa muito caro.

No meu caso tinha custado anorexia aos 13 anos. Uma mudança de visual brusca aos 11 e alisamento de cabelo durante três anos a partir dos 15. A adolescência não é gentil com ninguém, mas as vozes de pessoas ao meu redor dizendo o quanto eu era inadequada, e o quanto era minha obrigação me adequar, me fez acreditar que as pessoas eram perfeitas e que, então, a perfeição era alcançável. E me atirei na busca. O “você quer ajuda para aprender a se vestir melhor?” que eu tinha ouvido no começo da adolescência ecoava na minha cabeça junto com todos os cabelos lisos que faziam o meu parecer muito feio. 

Com os danos causados a mim mesma, eu percebi que não valia a pena e que a paz nunca ia chegar. Me vesti como quis, me arrumei como quis e, aos 20 anos, eu dizia no meu diálogo imaginário que a questão é sair do ciclo. Não buscar nada por meio da beleza, nem me contentar, mas aceitar que eu já era bonita, e, então, procurar outros caminhos menos sombrios de encontrar a felicidade. 

Mas ainda me diziam que eu tinha que ser bonita, e, por isso, eu tentava convencer. Eu queria paz. Será que eu consigo convencer você, caro leitor? Venha comigo nessa série sobre Beleza que o Sinestesia Literária preparou para você. Vamos adentrar os sentimentos das diferentes pessoas na sua busca particular, e, ao mesmo tempo comum, pelo tão desejado “padrão”. 

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