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Paralisia do sono

 

 

Sempre achei que tinha depressão. Ou algum transtorno sério de humor.

Era sempre como se eu estivesse levando socos no estômago de tempos em tempos. E era como se essas pequenas pancadas me levassem para um hospital da mente: dias fora de área, na maior parte do tempo adormecida.

 

Mas não tinha.

Descobri na semana passada quando o psicólogo me perguntou se havia mais algum outro caso de depressão na minha família, logo após um surto paralisador de uma sensação completamente nova e – ao contrário do que o termo “novidade” costuma significar – nada boa.

Depois disso, entendi que os comportamentos estranhos que eu andava tendo nas relações cotidianas eram reais, e que eu devia deixar meus amigos avisados.

Eu estava certa. Dias depois liguei para uma amiga com quem ainda não tinha falado sobre o assunto, pedindo que me buscasse: eu estava paralisada no chão de um lugar público.

- O que aconteceu?

- Eu estou com depressão.

 

Ela ficou em silêncio por um tempo.

- O que você sente?

Tentar explicar aquilo era a coisa mais difícil que eu já tinha feito na vida.

- Hm... sabe quando você está tendo um pesadelo e fica imóvel, sem conseguir se mexer e preso no sonho?

      

- Paralisia do sono, ué!

- SIM! É desse jeito que acontece.

Explico pra ela com detalhes cada coisa que sinto. Sinto que estou falando para mim mesma e acho que ela concorda.

- Você se sente triste? Tem pensamentos tristes?

Respondo que não.

- Eu não penso em nada na verdade. São sentimentos.

Eu abaixo a cabeça e falo cada vez mais baixo que é um pesadelo. Os sentimentos angustiantes aparecem e eu não consigo sair. Que é como se uma camada de gordura fria se colocasse sobre a minha personalidade e eu não conseguisse acessá-la. Então não penso. Eu quero, como se quer acordar de um sonho, reagir. Quero pensar e falar. Quero tomar banho e me levantar do saguão no qual ainda estou sentada contando essas coisas para ela.  Quero lavar o meu rosto e escrever meu texto. Mas o peso da paralisia faz tudo ser quase impossível.

 

Falo, quase entre lágrimas, que é claro que um dia vou me levantar da cama, mas que os minutos em que estou lá são quase eternos.

- Entendi perfeitamente, ela diz.

Me alegro pensando que encontrei uma irmã, apesar de ela não ter depressão. Pergunto então animada:

      

- Você já teve paralisia do sono?

- Não.

      

      

15 dez 2019

Milena Félix

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