
Deus
24 mai 2020
Milena Félix
Há um tempo percebi que existem coisas que eu insisto em fazer e que parecem boas, mas não são. Ou poderiam ser, mas acabam não sendo no final das contas. Escrever por si mesmo não é de todo bom, mesmo que pareça que todo o sentido que devo buscar na minha vida venha disso.
Me assusta que, às vezes, o mundo dos próprios escritores é um costurado de cenas de ficar bêbado, fumar, fazer sexo bêbado com muitas pessoas e depois escrever um texto amargurado sobre o sentimento amargurado que você tem da vida. Morrer jovem. Ou viver muito em uma vida solitária. Parece fazer parte da liberdade poética a autorização para acabar com a própria vida.
E é uma linha tão tênue, e a gente não sabe, o espaço entre ter as melhores intenções para estar confuso. E aí de estar confuso, para estar triste. E da tristeza logo podemos arranjar justificativa para fazer coisas estúpidas. “Beber para acabar com a dor”. Ninguém acredita nessa história. É claro que as primeiras vezes de coisas perigosas você faz com segurança. Usa capacete e mantém distância mínima. Mas na 20a vez você não tem mais medo nenhum e tudo que antes parecia inaceitável é totalmente natural agora.
Até atitudes bobas e claramente boas como fazer exercícios podem não ser genuinamente boas. Às vezes, eu saio para correr e tenho a certeza de que estou fazendo uma coisa boa para mim mesma. E até para os outros, já que eu com certeza vou ficar menos estressada. Mas de repente começo a pensar nas coisas que não devo pensar, enquanto corro. E isso sem contar o fato de que, se a gente coloca no exercício as nossas fragilidades mentais sobre o corpo e a autoestima, pode ir dormir numa noite depois de ter feito academia 5 vezes. Qualquer boa ação pode se tornar um vício, ou um escape pra não encarar a vida. Uma desculpa pra poder pensar “eu estou fazendo isso e é bom, não preciso me esforçar pra melhorar”.
Foi pensando nisso que percebi que nenhuma das coisas que faço de bom podem ser genuinamente boas sem a essência da bondade nelas. Um lápis sem o grafite dentro. E ainda que seja o caminho certo ter tal carreira e trabalhar nela, me casar com uma determinada pessoa, ter alimentação saudável e fazer terapia, tudo pode dar errado se eu não tiver bondade na essência. Eu posso largar a família pelo trabalho constante, encher meu relacionamento de egoísmos, nunca mais comer um carboidrato e não chegar em lugar nenhum depois de 10 anos de psicólogo.
Isso me faz pensar também se o exato oposto funciona da mesma forma: se eu tiver a iniciativa de fazer coisas que são, em geral ruins, consensualmente ruins, e tiver um impulso bom, o bem pode surgir? Claro que podemos pensar que um impulso bom, a essência boa, não produziria iniciativas ruins. Mas também podemos pensar que se estou em um ciclo de atitudes ruins não escolhidas conscientemente, o bem, quando surge, faz nascer uma bela flor no meio de um vaso de lodo. E certa hora as raízes da flor vão crescer tanto que serão capazes de quebrar o vaso. Mas eu ainda fico confusa sobre tudo isso.
E de onde vem então essa “essência boa”, essa coisa que povoa todo o espaço das ações boas e fazem elas ganharem sentido? Do todo bom, é claro. Onde seria a fonte da bondade se não de onde a bondade veio? De Deus, assim podemos chamar. Eu gosto de chamar assim. E então penso que nenhuma ação boa, se eu não estiver com meu coração em Deus, pode ser realmente boa. O mesmo vale para o exercício físico. Se eu saio para caminhar todos os dias no tempo em que eu deveria estar me conectando com o “Todo Bom”, para fugir de falar com Ele, então a atitude boa não só não é mais boa, mas me afasta do bem.

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