Felicidade Impossível
30 de ago | Reflexões | Leia em 5 min
Milena Félix
Quando a vida passar eu vou questionar o que eu estava fazendo neste momento aqui. Vou olhar para trás e tomar como certo que eu vivi e fui feliz. E, no futuro, quando estiver sofrendo, vou desejar ardentemente ter a vida de hoje.
Esta paz, descanso, família e amor familiar, juventude, sonhos e saúde. Como tudo é tão propício ao desejo de estar no presente. Tão rápido quanto eu sair daqui, vou sentir nostalgia do sorriso sincero dos meus pais, do meu útero e dedo anelar vazios.
E como dizer que este, exatamente este, não se parece com o melhor momento da minha vida? Como assumir tamanha ousadia a ponto de supor, que eu não seja plenamente feliz?
Eu olho para mim mesma com um olhar inquisitivo, pensando em todas as pessoas que sofrem, e me provoco com as dores, as perdas e as desigualdades. Parece obrigatório que eu esteja com a existência pronta diante de tudo que eu tenho.
Começo a desconfiar de que não há felicidade. Talvez não haja sequer contentamento alcançado do lado de fora, ou que não seja fruto único do exercício de se contentar. A pista do agora me faz atinar que todas as coisas que eu possa querer, nos momentos de descontentamento, têm significados únicos sobre aqueles momentos: elas tecem e complementam o descontentar-se. Mas nenhuma delas quer dizer coisa alguma sobre o meu real desejo. Nenhuma delas oferece garantia sobre a felicidade do momento em que eu alcançar quaisquer dessas coisas.
O fato de que eu irei desejar o presente quando ele passar, me faz procurar o que há de errado com o agora para que eu não o ame como o amarei depois. E eu, de fato, não o amo. O agora é como tudo o que já foi e o que vai ser.
Eu paro com um problema meio de gramática meio de filosofia sobre o que seria o ato de perceber, ser grato e plenamente feliz pelo agora. Nem existe palavra para descrever isso. “Reconhecimento”, “aproveitar”, “amar”, nada me parece suficiente para a ação de se encher do presente a ponto de não desejá-lo no futuro.
E percebo que não importa a grandeza do sonho, a realização é ordinária. Porque não existe extraordinário que não seja sonhar. Nem morar sozinho, nem uma casa bonita, nem dinheiro o suficiente para ir no café preferido comer segunda à tarde, nem um amor, nem uma noite de amor, nem uma carreira, nem um beijo de quem se ama, nem paz com a família escondem a felicidade. A busca agoniza e a conquista insatisfaz.
Desconfio então, que a energia da saudade e a do desejo devam estar bem aqui, empregadas no agora e não em outros momentos. Quem sabe assim, poderemos combater a insatisfação.
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